terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Libertação para os tolos

Tolos. Se você conhece algum, vai entender perfeitamente a razão pela qual considero a persuasão lógica e racional uma péssima estratégia no diálogo com eles. O motivo é bem simples: o tolo é, por natureza, prisioneiro de si mesmo — tão prisioneiro que a sua voz é a única coisa que ele consegue escutar enquanto o outro fala. Por isso, não perca o seu tempo tentando explicar para um tolo o que você está dizendo. Não adianta. A capacidade de ouvir, esforçando-se para entender o outro, não é um hábito cultivado por ele. Salomão tinha razão quando disse que “o tolo não tem prazer no entendimento, mas sim em expor os seus pensamentos” (Pv 18.2).

O que mais me espanta é constatar que tamanha insensibilidade não é resultado de um distúrbio no aparelho auditivo (antes fosse!), mas sim de um fascínio exagerado que o tolo tem por si mesmo. Quem dera esse fascínio fosse uma resposta positiva ao célebre imperativo do “conhece-te a ti mesmo!" Infelizmente não é esse o caso. Tal fascínio não passa de egolatria. Assim como Narciso, o tolo não busca entendimento, mas autoabsorção, ou seja, ele não quer entender, quer, na verdade, admirar a si mesmo. Por isso, não vale a pena esperar do tolo a autocrítica. Ele é demasiado narcisista. Não está acostumado a refletir seriamente sobre suas ideias.

O tolo não se interessa pelo entendimento, pois sabe que essa tarefa exige certa desconfiança de si mesmo. A autodesconfiança é um ato de humildade. É acima de tudo a capacidade de pensar sobre nós mesmos, sobre nossas próprias ideias, confrontando-as e suspeitando de que elas não são tão nossas como parecem ser. Falta ao tolo justamente esse gesto de humildade, pois carece do entendimento de que suas ideias não são tão originais como aparentam ser.

Entretanto, falta ao tolo não apenas o entendimento daqueles que desconfiam de si mesmos, mas também o rigor daqueles que corrigem suas opiniões principalmente quando elas não condizem com a verdade. A propósito, a falta de entendimento e de rigor autocrítico são os dois sinais mais visíveis de que a condição do tolo não poderia ser outra senão a de um aprisionamento. Afinal, quem não é capaz de ponderar, de inquirir a si mesmo e de corrigir seus equívocos jamais será livre o suficiente para enxergar o mundo à sua volta. Mas, antes de falarmos mais detidamente a respeito do aprisionamento do tolo, é necessário desfazer o equívoco que poderia induzir alguém a confundir tolice com limitação intelectual.

Tolice e limitação intelectual

Antes de mais nada, é bom esclarecer que não estou chamando de tolo aquele que não tem estudo nem formação intelectual, mesmo porque não acredito que os intelectuais sejam imunes a tolices e nem tampouco que os poucos instruídos não possam ser sábios. Aqueles que conseguem alcançar o cume da inteligência também podem atingir o cúmulo da tolice. Por exemplo, existem pessoas que são dotadas de uma inteligência arguta, que sacam bem as coisas, com rapidez e sagacidade impressionantes, mas mesmo assim são tolas. Um caso concreto é o do filósofo alemão Martin Heidegger, que, apesar de possuir uma incontestável habilidade lógica e filosófica, ingressou no Partido Nacional Socialista e defendeu com veemência as ideias divulgadas pela propaganda nazista.

Em contrapartida, existem pessoas que são muito lentas quando pensam, mas são tudo menos tolas. Lutero, por exemplo, vivia reclamando pelos cantos da Universidade de Erfurt, na Alemanha, de que ele jamais poderia ser um teólogo de verdade porque se considerava lento demais para a filosofia e para o raciocínio lógico; e, diga-se de passagem, muitos seguidores de Philipp Melanchthon concordariam com Lutero. Mas foi esse teólogo pouco afeito à lógica e à filosofia o responsável por uma das mais importantes transformações ocorridas na igreja no alvorecer do século XVI. Tolice, portanto, não é sinônimo de limitação intelectual.

No entanto, não é suficiente desfazer o equívoco que leva alguém a confundir tolice com limitação intelectual. É preciso ir mais longe e dizer que a tolice não representa a fraqueza de alguns. Pelo contrário, ela é universal, é uma fraqueza inerente a todos os seres humanos. Todos os homens são, por natureza, tolos. A questão, portanto, não é saber como um homem se torna tolo, mas sim como pode deixar de sê-lo.

Na ocasião em que foi preso pelos agentes da Gestapo, o teólogo luterano Dietrich Bonhoeffer escreveu inúmeras cartas, as famosas “cartas da prisão”. Numa delas, ele disse que “somente um ato de libertação poderia vencer a tolice; um ato de instrução ou argumentação lógica nada pode fazer para convencer o tolo de sua tolice. Antes de tudo, o tolo precisa de uma libertação interior autêntica, e enquanto isso não ocorre temos de desistir de todas as tentativas de persuadi-lo”1.  Por isso, insistimos que não adianta discutir com o tolo. Enquanto ele não for liberto de si mesmo, qualquer palavra que for dirigida contra a sua tolice será como uma pérola lançada aos porcos.

O tolo e as sombras da caverna
A ideia de que, para alcançar o entendimento, é necessária uma “libertação interior autêntica” é bem antiga e pode ser, de certa forma, encontrada no livro VII da República. Nele, Platão descreve Sócrates dizendo para o jovem Glauco que, para as pessoas alcançarem o entendimento, elas precisam ser primeiramente libertas. Para explicar melhor essa ideia, o filósofo contou um mito sobre seres humanos que, desde o seu nascimento, estão aprisionados em uma caverna subterrânea. Eles não sabem o que é o mundo fora da caverna. Suas pernas e seu pescoço estão algemados de tal sorte que são forçados a permanecer sempre no mesmo lugar e a olhar apenas na direção de uma parede ao fundo.

Atrás deles, na entrada da caverna, há um foco de luz que ilumina todo o ambiente. Entre esse foco de luz e os prisioneiros, há uma subida ao longo da qual foi erguida uma mureta. E para além dessa mureta, encontram-se homens que transportam estátuas que ultrapassam a altura da mureta. Eles carregam estátuas de todos os tipos: de seres humanos, de animais e de toda sorte de objetos. Por causa do foco de luz e da posição que ele ocupava, os prisioneiros são capazes de enxergar, na parede ao fundo, as sombras dessas estátuas, mas sem conseguirem ver as próprias estátuas, nem os homens que as carregam. Como nunca viram outra coisa além das sombras, os prisioneiros pensam que elas são as próprias coisas. Ou seja, não podem saber que as sombras não passam de projeções das coisas, nem podem saber que as coisas projetadas são apenas estátuas carregadas por outros seres humanos.

O que aconteceria, pergunta Sócrates a Glauco, se alguém libertasse os prisioneiros? O que faria um prisioneiro se fosse liberto de suas algemas? Sem dúvida, olharia toda a caverna. Ao seu redor, veria os outros prisioneiros, a mureta às suas costas, as estátuas e a entrada da caverna. Seu corpo doeria a cada passo dado. Afinal de contas, ele ficou imóvel durante muitos anos. Não bastassem as dores do corpo, ao se dirigir à entrada da caverna ficaria momentaneamente cego, pois aquele foco de luz que clareava a caverna, na verdade, era o sol com todo o seu fulgor. Contudo, com o passar do tempo, já acostumado com a claridade, seria capaz de ver não só as estátuas, mas também os homens que as carregavam. Prosseguindo em seu caminho, passaria a enxergar as próprias coisas, descobrindo que, durante toda a sua vida, não contemplara nada, a não ser as sombras das estátuas projetadas no fundo da caverna.

Na condição de conhecedor desse “novo” mundo, o prisioneiro liberto regressaria ao velho mundo subterrâneo. Ao chegar, ele contaria aos outros prisioneiros o que viu. Sua missão seria libertá-los, pois é somente na condição de homem livre que alguém pode ser capaz de contemplar o mundo das coisas tais como elas são. O que mais poderia acontecer após esse retorno? Uma estranha reação. Ao voltar e contar o que viu, os demais prisioneiros zombariam dele, não acreditariam em suas palavras, pois, para eles, o único mundo admissível é o mundo no fundo da caverna. No entanto, se o escravo liberto teimasse em afirmar o que viu e insistisse em convidá-los a sair da caverna, os prisioneiros das sombras o matariam. E foi assim que Sócrates concluiu o famoso “mito da caverna”.

Tolos são como os prisioneiros que tomam as sombras como se fossem as coisas mesmas. Veja bem, o problema não está nas sombras. Aparentemente não há nada de errado com elas. O problema está no prisioneiro que não consegue perceber que as sombras são apenas uma espécie de vestígio de algo que está muito além delas. Assim como os prisioneiros no fundo da caverna, o tolo não consegue perceber que ele e suas ideias ultrapassam a si mesmos.

Já aquele que deixou de ser tolo é como o prisioneiro que não mais se satisfaz com as sombras projetadas no fundo da caverna, mas que, impulsionado pela curiosidade e pelo desejo de contemplar as coisas mesmas, se dirige para o outro lado, o lado da origem de tudo o que acontece no fundo da caverna. Entretanto, isso só é possível se o tolo for liberto de sua tolice. Nesse aspecto, tanto o platonismo como o cristianismo são bastante parecidos. Ambos reconhecem que o conhecimento da verdade, que salva o homem da tolice, pressupõe libertação. Ou melhor, uma dupla libertação, pois uma coisa é a libertação para conhecer e outra bem diferente é o conhecimento que liberta.

Dupla libertação e inteligência humilhada
Pois bem, o tolo precisa de uma dupla libertação: a libertação que é resultado do próprio conhecimento da verdade e a libertação que é fruto do irrompimento de um poder que liberta o tolo para conhecer a verdade. Por exemplo, alguém que tenha uma venda nos olhos só poderá enxergar o que está acontecendo à sua volta se ela for primeiro retirada. Nesse caso, o ato de enxergar pressupõe o ato de remover a venda. De forma semelhante, a libertação pelo conhecimento pressupõe a libertação para o conhecimento.

A libertação pelo conhecimento é semelhante ao ato de enxergar; já a libertação para o conhecimento é semelhante ao ato de remover a venda. Assim como para enxergar é necessário que primeiro seja removida a venda, também é necessária a libertação para o conhecimento a fim de que haja libertação peloconhecimento. Ora, quem ou o que é responsável pela libertação para o conhecimento? Que poder é esse que liberta o coração do tolo para o conhecimento da verdade? É exatamente na resposta a essas indagações que o platonismo e o cristianismo se distanciam, permanecendo ambos em lados diametralmente opostos e irreconciliáveis.

Para o platonismo, o poder que liberta o tolo reside no próprio homem. É o homem que se liberta. É o tolo que busca forças em si mesmo para se libertar da tolice. Em contrapartida, o cristianismo reconhece a completa insuficiência e a incapacidade de o tolo se libertar. Não há no tolo recursos disponíveis e suficientemente capazes de libertá-lo para o conhecimento da verdade.

Se o platônico busca em si mesmo a libertação da tolice é porque ele acredita que a mera autorreflexão o tornará livre para conhecer a verdade. E, nesse sentido, o platonismo ainda é refém da autoabsorção do tolo. Já o cristão, ao contrário, se humilha diante de um poder superior que irrompe no coração do tolo e o livra de seu maior pecado: a autorreferência. O cristão sabe que não adianta tentar persuadir aquele que é prisioneiro de si mesmo. Por experiência própria, o cristão reconhece que somente um poder infinitamente superior poderá convencer o tolo de sua tolice.

Há quem pense que Platão, por causa da condenação de Sócrates, tenha desacreditado a maiêutica socrática2. Polêmicas à parte, o fato é que o platônico de carteirinha acredita que apenas com o uso da razão o tolo será liberto. Entretanto, parece que a libertação para o conhecimento requer mais do que o mero exercício da razão. O platônico acerta quando reconhece que é necessária a libertação do tolo, mas erra quando acredita que essa libertação reside na autonomia da capacidade racional do tolo. No final das contas, isso não passa de tolice disfarçada. Tal disfarce não convence, pois o homem sempre ultrapassa suas máscaras.

Na contramão do disfarce platônico está a inteligência humilhada do cristão. E que não se confunda “inteligência humilhada” com sacrificium intellectus! O cristão não pressupõe a morte da razão. O que ele pressupõe é a consciência de que a razão é insuficiente. Nesse sentido, podemos dizer que o cristão exige algo bem menos do que a autonomia da razão, porém bem mais do que o sacrifício do intelecto. Para o cristão, o que de fato está em jogo é a constatação de que a inteligência humana é insuficiente para conhecer a verdade. Ou seja, para chegar ao conhecimento verdadeiro, a razão depende de um poder que a transcende, que ultrapassa seus limites.

O platônico e o cristão entendem que a libertação implica a conscientização de si mesmo, isto é, o conhecimento de sua real condição. A diferença está no que ambos entendem ser a origem dessa conscientização. Para o platônico a consciência da real condição do tolo está no próprio tolo, uma vez que tal consciência é resultado da mera autorreflexão; para o cristão, por sua vez, a conscientização é fruto da ação interna do Espírito que liberta o coração do tolo para ouvir em primeiro lugar a voz de Deus. O cristão acredita que é a palavra de Deus, iluminada pelo Espírito, que conscientiza o tolo de sua tolice. Portanto, é o Espírito que liberta o tolo de si mesmo e o coloca diante de Deus. E, quando se está diante de Deus, não há pensamento algum que seja relevante o suficiente para ser dito. Eis a condição para a libertação do tolo: ouvir. E o próprio ato de ouvir já é por si só o primeiro sinal de uma “libertação interior autêntica”.

João Calvino chama essa ação do Espírito, que coloca o tolo diante de Deus, de testimonium internum Spiritus Sancti [testemunho interno do Espírito Santo] (Institutas, 1.7.4-5; 3.2.33). Calvino entende que, para o tolo ouvir a voz divina, não basta Deus falar. A razão é simples. O tolo é, por natureza, surdo para ouvir a voz de Deus e cego para enxergar a verdade revelada. Por isso, antes de ouvir, ele precisa ser curado de sua surdez; antes de ver, ele precisa ser curado de sua cegueira. Nas palavras de Calvino, “a palavra de Deus é semelhante ao sol: ilumina a todos a quem é pregada, mas não produz fruto entre os cegos. E, nessa parte, todos nós somos, por natureza, cegos. Por isso não pode penetrar em nossa mente, a não ser pelo acesso que lhe dá o Espírito, esse mestre interior, com sua iluminação” [Intitutas, 3.2.34]3.

O cristão, portanto, não nega que o conhecimento da verdade liberta o tolo, porém afirma que, antes de conhecer a verdade, o tolo precisa de uma libertação que não é fruto nem de uma reflexão sobre a verdade e muito menos de uma autorreflexão, mas sim de uma ação interna do Espírito que, com efeito, liberta o tolo para o conhecimento da verdade.

De fato, o platônico acerta quando diz que a condição primordial não é conhecer para ser liberto, mas ser liberto para conhecer. Todavia, equivoca-se quando entende que o poder que liberta é a mera reflexão. Nem mera reflexão, nem conhecimento teórico algum poderão libertar o tolo para o conhecimento da verdade. Algumas pessoas pensam que o remédio para a tolice está num seminário teológico, numa faculdade de filosofia ou num laboratório de ciências. Ledo engano. O seminário, a faculdade ou o laboratório podem ser mais sombrios que o fundo de uma caverna. Deus não fala a teólogos, filósofos e cientistas, mas a tolos perdidos em si mesmos. É uma tremenda tolice esperar dos seminários de teologia, das faculdades de filosofia ou dos laboratórios de ciências aquilo que somente o confronto com a voz de Deus pode dar. Como diz Herman Dooyeweerd,

o verdadeiro conhecimento de Deus e de nós mesmos (Deum et animam scire) ultrapassa todo o pensamento teórico. Esse conhecimento não pode ser objeto teórico, seja de uma teologia dogmática seja de uma filosofia cristã. Ele pode apenas ser adquirido pela operação da palavra de Deus e do Espírito Santo no coração, ou seja, na raiz e centro religioso de nossa existência e experiência humanas em sua inteireza4

Em contraste com o platônico, o cristão entende que o único poder capaz de libertar o tolo é a voz de Deus. Apenas a palavra de Deus pode entrar no coração do tolo e romper as cadeias que o impedem de conhecer a verdade. Não! A libertação do coração não depende das artimanhas e dos improvisos do tolo! Não há nada no tolo que seja capaz de libertá-lo. Embora a libertação aconteça no seu interior, isso não significa que o tolo seja capaz de libertar-se. O poder de que falamos é de uma grandeza inalcansável e infinitamente superior. Trata-se do poder da voz que disse “Haja luz!” e houve luz. Ou seja, trata-se do poder que criou todas as coisas a partir do nada (ex nihilo) e com o poder da palavra. Não estamos falando de um poder que criou o mundo como um demiurgo que modela a matéria a partir das formas que desde sempre existiram. Pelo contrário, falamos de um poder que criou o mundo e tudo o que nele há apenas com a força de sua voz. É admirável pensar que o poder que fala ao coração do tolo seja o mesmo poder daquele que criou o universo simplesmente falando.

Conclusão
Para o cristão, a inteligência humilhada é uma condição que não pode ser evitada. Não há prevenção contra ela. Nenhuma criatura pode evitar a humilhação inerente à sua própria condição de criatura. A inteligência humilhada não é uma possibilidade, mas sim uma realidade, a realidade da Criação. A razão humana não deveria ser louvada quando o homem se recusa a humilhar-se diante de Deus5.  Ora, não existe algo como “a classe das inteligências que se humilham” e outro como “a classe das inteligências que não se humilham”. Diante de Deus, toda inteligência criada está sob a condição da humilhação. Em contrapartida, o que de fato existe é a consciência ou não de que, diante de Deus, toda inteligência criada está sob a condição da humilhação. Observe o sábio conselho que Blaise Pascal, filósofo e matemático francês, deu para os que acreditam que o seu próprio entendimento é um recurso suficiente para o conhecimento da verdade:

Conhecei, pois, soberbo, que paradoxo sois para vós mesmos. Humilhai-vos, razão impotente! Calai-vos, natureza imbecil; aprendei que o homem ultrapassa infinitamente o homem e ouvi de vosso Mestre vossa condição verdadeira que ignorais. Escutai a voz de Deus6

Isso é o mesmo que dizer que nenhum louvor cabe ao tolo pelo conhecimento da verdade, o que é demasiadamente chocante para aqueles que são mais otimistas com relação à autonomia da razão. E não deveria deixar de ser, pois quem advoga a autonomia da razão acredita que o único poder que liberta o tolo está na própria natureza racional do ser humano. Na verdade, a atitude de buscar na natureza racional o poder para a libertação da tolice revela o quanto o tolo pode ser ainda mais tolo. E como dizia Salomão, “o tolo que faz uma tolice pela segunda vez é como um cão que volta ao seu vômito” (Pv 26.11).

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 1 Dietrich Bonhoeffer.

domingo, 27 de janeiro de 2013

Os Desigrejado



Postado por Augustus Nicodemus Lopes

Para mim resta pouca dúvida de que a igreja institucional e organizada está hoje no centro de acirradas discussões em praticamente todos os quartéis da cristandade, e mesmo fora dela. O surgimento de milhares de denominações evangélicas, o poderio apostólico de igrejas neopentecostais, a institucionalização e secularização das denominações históricas, a profissionalização do ministério pastoral, a busca de diplomas teológicos reconhecidos pelo estado, a variedade infindável de métodos de crescimento de igrejas, de sucesso pastoral, os escândalos ocorridos nas igrejas, a falta de crescimento das igrejas tradicionais, o fracasso das igrejas emergentes – tudo isto tem levado muitos a se desencantarem com a igreja institucional e organizada.

Alguns simplesmente abandonaram a igreja e a fé. Mas, outros, querem abandonar apenas a igreja e manter a fé. Querem ser cristãos, mas sem a igreja. Muitos destes estão apenas decepcionados com a igreja institucional e tentam continuar a ser cristãos sem pertencer ou frequentar nenhuma. Todavia, existem aqueles que, além de não mais frequentarem a igreja, tomaram esta bandeira e passaram a defender abertamente o fracasso total da igreja organizada, a necessidade de um cristianismo sem igreja e a necessidade de sairmos da igreja para podermos encontrar Deus. Estas idéias vêm sendo veiculadas através de livros, palestras e da mídia. Viraram um movimento que cresce a cada dia. São os desigrejados.

Muitos livros recentes têm defendido a desigrejação do cristianismo (*). Em linhas gerais, os desigrejados defendem os seguintes pontos.

1) Cristo não deixou qualquer forma de igreja organizada e institucional.

2) Já nos primeiros séculos os cristãos se afastaram dos ensinos de Jesus, organizando-se como uma instituição, a Igreja, criando estruturas, inventando ofícios para substituir os carismas, elaborando hierarquias para proteger e defender a própria instituição, e de tal maneira se organizaram que acabaram deixando Deus de fora. Com a influência da filosofia grega na teologia e a oficialização do cristianismo por Constantino, a igreja corrompeu-se completamente.

3) Apesar da Reforma ter se levantado contra esta corrupção, os protestantes e evangélicos acabaram caindo nos mesmíssimos erros, ao criarem denominações organizadas, sistemas interligados de hierarquia e processos de manutenção do sistema, como a disciplina e a exclusão dos dissidentes, e ao elaborarem confissões de fé, catecismos e declarações de fé, que engessaram a mensagem de Jesus e impediram o livre pensamento teológico.

4) A igreja verdadeira não tem templos, cultos regulares aos domingos, tesouraria, hierarquia, ofícios, ofertas, dízimos, clero oficial, confissões de fé, rol de membros, propriedades, escolas, seminários.

5) De acordo com Jesus, onde estiverem dois ou três que crêem nele, ali está a igreja, pois Cristo está com eles, conforme prometeu em Mateus 18. Assim, se dois ou três amigos cristãos se encontrarem no Frans Café numa sexta a noite para falar sobre as lições espirituais do filme O Livro de Eli, por exemplo, ali é a igreja, não sendo necessário absolutamente mais nada do tipo ir à igreja no domingo ou pertencer a uma igreja organizada.

6) A igreja, como organização humana, tem falhado e caído em muitos erros, pecados e escândalos, e prestado um desserviço ao Evangelho. Precisamos sair dela para podermos encontrar a Deus.

Eu concordo com vários dos pontos defendidos pelos desigrejados. Infelizmente, eles estão certos quanto ao fato de que muitos evangélicos confundem a igreja organizada com a igreja de Cristo e têm lutado com unhas e dentes para defender sua denominação e sua igreja, mesmo quando estas não representam genuinamente os valores da Igreja de Cristo. Concordo também que a igreja de Cristo não precisa de templos construídos e nem de todo o aparato necessário para sua manutenção. Ela, na verdade, subsistiu de forma vigorosa nos quatro primeiros séculos se reunindo em casas, cavernas, vales, campos, e até cemitérios. Os templos cristãos só foram erigidos após a oficialização do Cristianismo por Constantino, no séc. IV.

Os desigrejados estão certos ao criticar os sistemas de defesa criados para perpetuar as estruturas e a hierarquia das igrejas organizadas, esquecendo-se das pessoas e dando prioridade à organização. Concordo com eles que não podemos identificar a igreja com cultos organizados, programações sem fim durante a semana, cargos e funções como superintendente de Escola Dominical, organizações internas como uniões de moços, adolescentes, senhoras e homens, e métodos como células, encontros de casais e de jovens, e por ai vai. E também estou de acordo com a constatação de que a igreja institucional tem cometido muitos erros no decorrer de sua longa história.

Dito isto, pergunto se ainda assim está correto abandonarmos a igreja institucional e seguirmos um cristianismo em vôo solo. Pergunto ainda se os desigrejados não estão jogando fora o bebê junto com a água suja da banheira. Ao final, parece que a revolta deles não é somente contra a institucionalização da igreja, mas contra qualquer coisa que imponha limites ou restrições à sua maneira de pensar e de agir. Fico com a impressão que eles querem se livrar da igreja para poderem ser cristãos do jeito que entendem, acreditarem no que quiserem – sendo livres pensadores sem conclusões ou convicções definidas – fazerem o que quiserem, para poderem experimentar de tudo na vida sem receio de penalizações e correções. Esse tipo de atitude anti-instituição, antidisciplina, anti-regras, anti-autoridade, antilimites de todo tipo se encaixa perfeitamente na mentalidade secular e revolucionária de nosso tempo, que entra nas igrejas travestida de cristianismo.

É verdade que Jesus não deixou uma igreja institucionalizada aqui neste mundo. Todavia, ele disse algumas coisas sobre a igreja que levaram seus discípulos a se organizarem em comunidades ainda no período apostólico e muito antes de Constantino.

1) Jesus disse aos discípulos que sua igreja seria edificada sobre a declaração de Pedro, que ele era o Cristo, o Filho do Deus vivo (Mt 16.15-19). A igreja foi fundada sobre esta pedra, que é a verdade sobre a pessoa de Jesus (cf. 1Pd 2.4-8). O que se desviar desta verdade – a divindade e exclusividade da pessoa de Cristo – não é igreja cristã. Não admira que os apóstolos estivessem prontos a rejeitar os livre-pensadores de sua época, que queriam dar uma outra interpretação à pessoa e obra de Cristo diferente daquela que eles receberam do próprio Cristo. As igrejas foram instruídas pelos apóstolos a rejeitar os livre-pensadores como os gnósticos e judaizantes, e libertinos desobedientes, como os seguidores de Balaão e os nicolaítas (cf. 2Jo 10; Rm 16.17; 1Co 5.11; 2Ts 3.6; 3.14; Tt 3.10; Jd 4; Ap 2.14; 2.6,15). Fica praticamente impossível nos mantermos sobre a rocha, Cristo, e sobre a tradição dos apóstolos registrada nas Escrituras, sem sermos igreja, onde somos ensinados, corrigidos, admoestados, advertidos, confirmados, e onde os que se desviam da verdade apostólica são rejeitados.

2) A declaração de Jesus acima, que a sua igreja se ergue sobre a confissão acerca de sua Pessoa, nos mostra a ligação estreita, orgânica e indissolúvel entre ele e sua igreja. Em outro lugar, ele ilustrou esta relação com a figura da videira e seus galhos (João 15). Esta união foi muito bem compreendida pelos seus discípulos, que a compararam à relação entre a cabeça e o corpo (Ef 1.22-23), a relação marido e mulher (Ef 5.22-33) e entre o edifício e a pedra sobre o qual ele se assenta (1Pd 2.4-8). Os desigrejados querem Cristo, mas não querem sua igreja. Querem o noivo, mas rejeitam sua noiva. Mas, aquilo que Deus ajuntou, não o separe o homem. Não podemos ter um sem o outro.

3) Jesus instituiu também o que chamamos de processo disciplinar, quando ensinou aos seus discípulos de que maneira deveriam proceder no caso de um irmão que caiu em pecado (Mt 18.15-20). Após repetidas advertências em particular, o irmão faltoso, porém endurecido, deveria ser excluído da “igreja” – pois é, Jesus usou o termo – e não deveria mais ser tratado como parte dela (Mt 18.17). Os apóstolos entenderam isto muito bem, pois encontramos em suas cartas dezenas de advertências às igrejas que eles organizaram para que se afastassem e excluíssem os que não quisessem se arrepender dos seus pecados e que não andassem de acordo com a verdade apostólica. Um bom exemplo disto é a exclusão do “irmão” imoral da igreja de Corinto (1Co 5). Não entendo como isto pode ser feito numa fraternidade informal e livre que se reúne para bebericar café nas sextas à noite e discutir assuntos culturais, onde não existe a consciência de pertencemos a um corpo que se guia conforme as regras estabelecidas por Cristo.

4) Jesus determinou que seus seguidores fizessem discípulos em todo o mundo, e que os batizassem e ensinassem a eles tudo o que ele havia mandado (Mt 28.19-20). Os discípulos entenderam isto muito bem. Eles organizaram os convertidos em igrejas, os quais eram batizados e instruídos no ensino apostólico. Eles estabeleceram líderes espirituais sobre estas igrejas, que eram responsáveis por instruir os convertidos, advertir os faltosos e cuidar dos necessitados (At 6.1-6; At 14.23). Definiram claramente o perfil destes líderes e suas funções, que iam desde o governo espiritual das comunidades até a oração pelos enfermos (1Tm 31-13; Tt 1.5-9; Tg 5.14).

5) Não demorou também para que os cristãos apostólicos elaborassem as primeiras declarações ou confissões de fé que encontramos (cf. Rm 10.9; 1Jo 4.15; At 8.36-37; Fp 2.5-11; etc.), que serviam de base para a catequese e instrução dos novos convertidos, e para examinarem e rejeitarem os falsos mestres. Veja, por exemplo, João usando uma destas declarações para repelir livre-pensadores gnósticos das igrejas da Ásia (2Jo 7-10; 1Jo 4.1-3). Ainda no período apostólico já encontramos sinais de que as igrejas haviam se organizado e estruturado, tendo presbíteros, diáconos, mestres e guias, uma ordem de viúvas e ainda presbitérios (1Tm 3.1; 5.17,19; Tt 1.5; Fp 1.1; 1Tm 3.8,12; 1Tm 5.9; 1Tm 4.14). O exemplo mais antigo que temos desta organização é a reunião dos apóstolos e presbíteros em Jerusalém para tratar de um caso de doutrina – a inclusão dos gentios na igreja e as condições para que houvesse comunhão com os judeus convertidos (At 15.1-6). A decisão deste que ficou conhecido como o “concílio de Jerusalém” foi levada para ser obedecida nas demais igrejas (At 16.4), mostrando que havia desde cedo uma rede hierárquica entre as igrejas apostólicas, poucos anos depois de Pentecostes e muitos anos antes de Constantino.

6) Jesus também mandou que seus discípulos se reunissem regularmente para comer o pão e beber o vinho em memória dele (Lc 22.14-20). Os apóstolos seguiram a ordem, e reuniam-se regularmente para celebrar a Ceia (At 2.42; 20.7; 1Co 10.16). Todavia, dada à natureza da Ceia, cedo introduziram normas para a participação nela, como fica evidente no caso da igreja de Corinto (1Co 11.23-34). Não sei direito como os desigrejados celebram a Ceia, mas deve ser difícil fazer isto sem que estejamos na companhia de irmãos que partilham da mesma fé e que crêem a mesma coisa sobre o Senhor.

É curioso que a passagem predileta dos desigrejados – “onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18.20) – foi proferida por Jesus no contexto da igreja organizada. Estes dois ou três que ele menciona são os dois ou três que vão tentar ganhar o irmão faltoso e reconduzi-lo à comunhão da igreja (Mt 18.16). Ou seja, são os dois ou três que estão agindo para preservar a pureza da igreja como corpo, e não dois ou três que se separam dos demais e resolvem fazer sua própria igrejinha informal ou seguir carreira solo como cristãos.

O meu ponto é este: que muito antes do período pós-apostólico, da intrusão da filosofia grega na teologia da Igreja e do decreto de Constantino – os três marcos que segundo os desigrejados são responsáveis pela corrupção da igreja institucional – a igreja de Cristo já estava organizada, com seus ofícios, hierarquia, sistema disciplinar, funcionamento regular, credos e confissões. A ponto de Paulo se referir a ela como “coluna e baluarte da verdade” (1Tm 3.15) e o autor de Hebreus repreender os que deixavam de se congregar com os demais cristãos (Hb 10.25). O livro de Atos faz diversas menções das “igrejas”, referindo-se a elas como corpos definidos e organizados nas cidades (cf. At 15.41; 16.5; veja também Rm 16.4,16; 1Co 7.17; 11.16; 14.33; 16.1; etc. – a relação é muito grande).

No final, fico com a impressão que os desigrejados, na verdade, não são contra a igreja organizada meramente porque desejam uma forma mais pura de Cristianismo, mais próxima da forma original – pois esta forma original já nasceu organizada e estruturada, nos Evangelhos e no restante do Novo Testamento. Acho que eles querem mesmo é liberdade para serem cristãos do jeito deles, acreditar no que quiserem e viver do jeito que acham correto, sem ter que prestar contas a ninguém. Pertencer a uma igreja organizada, especialmente àquelas que historicamente são confessionais e que têm autoridades constituídas, conselhos e concílios, significa submeter nossas idéias e nossa maneira de viver ao crivo do Evangelho, conforme entendido pelo Cristianismo histórico. Para muitos, isto é pedir demais.

Eu não tenho ilusões quanto ao estado atual da igreja. Ela é imperfeita e continuará assim enquanto eu for membro dela. A teologia Reformada não deixa dúvidas quanto ao estado de imperfeição, corrupção, falibilidade e miséria em que a igreja militante se encontra no presente, enquanto aguarda a vinda do Senhor Jesus, ocasião em que se tornará igreja triunfante. Ao mesmo tempo, ensina que não podemos ser cristãos sem ela. Que apesar de tudo, precisamos uns dos outros, precisamos da pregação da Palavra, da disciplina e dos sacramentos, da comunhão de irmãos e dos cultos regulares.

Cristianismo sem igreja é uma outra religião, a religião individualista dos livre-pensadores, eternamente em dúvida, incapazes de levar cativos seus pensamentos à obediência de Cristo.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

No fim dos tempos, a fé verdadeira será raríssima .


Digo-vos que, depressa, lhes fará justiça. Contudo, quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra? – Lucas 18.8
O Senhor Jesus mostra isso ao fazer pergunta mui solene: “quando vier o Filho do Homem, achará, porventura, fé na terra?”.

A indagação que temos diante de nós é deveras vexatória e mostra a inutilidade de esperarmos que o mundo inteiro esteja convertido antes que Cristo volte. Mostra a tolice de supormos que todas as pessoas são “boas” e que, apesar de diferirem em questões externas, todas estão certas no coração, e vão todas para o céu. Essas noções não encontram apoio no texto diante de nós.

Afinal, de que adianta ignorar os fatos que estão diante dos nossos olhos: fatos no mundo, fatos nas igrejas, fatos nas congregações a que pertencemos, fatos lado a lado das nossas portas e lares? Onde a fé deve ser vista?

Quantos ao nosso redor creem realmente naquilo que está na Bíblia? Quantos vivem como se cressem que Cristo morreu por eles e que há um juízo, um céu é um inferno? Essas são perguntas dolorosas e graves. Mas exigem e merecem uma resposta.

E nós mesmos, temos fé? Se temos, louvemos a Deus por isso. É uma grande bênção crer na Bíblia inteira. É motivo para ações de graças diárias, se temos consciência dos nossos pecados e confiamos realmente em Jesus. Podemos ser pecadores débeis, frágeis, imperfeitos, insuficientes; mas cremos de fato? Essa é a grande questão. Se crermos, seremos salvos. Quem não crê, porém, não verá a vida e morrerá em seus pecados (João 3.36; 8.24).

Autor: J. C. Ryle (1816–1900)

domingo, 20 de janeiro de 2013

Um evangelho digno de morrermos por ele

Por: Charles Spurgeon
Extraído do sermão “A Gospel Worth Dying For” pregado na manhã de 12 de agosto de 1883.

O que era esse evangelho pelo qual Paulo estava disposto a morrer?

Não era qualquer coisa chamada “evangelho” que produzia esse entusiasmo. Em nossos dias, temos evangelhos pelos quais eu não morreria, nem recomendaria a qualquer de vocês que vivessem por eles, pois são evangelhos que se extinguirão em poucos anos. Nunca é digno que morramos por uma doutrina que morrerá por si mesma. Já vivi tempo suficiente para ver o surgimento, o florescimento e a decadência de vários evangelhos. Há muito me disseram que minha velha doutrina calvinista estava ultrapassada, era uma coisa desacreditada. Em seguida, ouvi que o ensino evangélico, em qualquer forma, era uma coisa do passado que seria suplantada por “pensamentos avançados”.

No entanto, costumava haver no mundo um evangelho que consistia de fatos nunca duvidados pelos verdadeiros cristãos. Na igreja havia um evangelho que os crentes abrigaram no coração como se fosse a vida de sua alma. No mundo, costumava haver um evangelho que provocava entusiasmo e recomendava o sacrifício. Milhares e milhares se reuniam para ouvir esse evangelho ao risco de sua própria vida. Homens o pregaram, mesmo em face da oposição dos tiranos; sofreram a perda de todas as coisas, foram presos e mortos por causa desse evangelho, cantando salmos em todo o tempo. Não há remanescente desse evangelho? Ou chegamos à terra da ilusão, na qual as almas passam fome, alimentando-se de suposições, e se tornam incapazes de ter confiança ou zelo? Os discípulos de Jesus estão agora se alimentando da espuma do “pensamento” e do vento da imaginação, nos quais os homens se enlevam e ficam exaltados? Ou retornaremos ao alimento substancial da revelação infalível e clamaremos ao Espírito Santo que nos alimente com sua própria Palavra inspirada?

O que era esse evangelho que Paulo valorizava mais do que sua própria vida?

Paulo o chamou de “evangelho da graça de Deus”. O aspecto do evangelho que mais impressionou o apóstolo foi o de que era uma mensagem da graça, e tão-somente da graça. Em meio à música das boas-novas, uma nota se sobressaía às outras e encantava os ouvidos do apóstolo. Essa nota era a graça — a graça de Deus. Essa nota ele considerava característica de toda a melodia; o evangelho era o “evangelho da graça de Deus”. Em nossos dias, a palavra graça não é muito ouvida; ouvimos a respeito dos deveres morais, ajustes científicos e progresso humano. Quem nos fala sobre a graça de Deus, exceto umas poucas pessoas antiquadas que logo passarão? Sou uma dessas pessoas antiquadas, por isso tentarei ecoar essa palavra graça, para que todos os que conhecem o seu som se regozijem, e ela penetre o coração daqueles que a desprezam.

A graça é a essência do evangelho

A graça é a única esperança para este mundo caído! É o único consolo para os santos que esperam pela glória. No que concerne à graça, talvez Paulo tinha uma percepção mais clara do que Pedro, Tiago ou João; por isso, ele escreveu mais no Novo Testamento. Os outros escritores apostólicos excederam a Paulo em outros aspectos, mas ele, devido à clareza e à profundidade na doutrina da graça, permanece como o primeiro e o mais importante. Precisamos novamente de Paulo ou, pelo menos, do evangelismo e da clareza paulinos. Ele desprezaria esses novos evangelhos e diria aos que o seguem: “Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo” (Gl 1.6-7).

Acusações contra a Igreja


Por Paul Washer

 uma falha ao falar da depravação do homem
Quando eu olho para o livro de Romanos, que é um dos meus livros preferidos da Bíblia, ele não é uma teologia sistemática, mas se você pudesse dizer que qualquer livro da Bíblia foi uma teologia sistemática o livro de Romanos seria o mais próximo. Não é surpreendente que Paulo gasta os três primeiros capítulos do livro procurando fazer uma coisa? Levar todos os homens à condenação. Levar todos os homens à condenação.

Mas não é que a condenação seja seu grande bem supremo de sua teologia. Não é o seu fim ou o seu objetivo final. É um meio para trazer salvação para seus leitores, porque os homens têm que ser levados ao conhecimento de si próprios, antes de entregar a si próprios a Deus. Hoje, os homens são feitos de tal modo decaídos que você tem que cortar deles absolutamente toda esperança na carne antes que eles possam ser levados a Deus.

Isto é importante em tudo, mas é especialmente importante no evangelismo.

Eu me lembro. Eu tinha 21 anos e tinha acabado de ser chamado para pregar e eu caminhava em uma antiga loja onde eles venderiam ternos para os ministros pela metade do preço. Eles têm feito isso por 50, 60 anos. E eu caminhava lá dentro, e eu estava procurando um terno em Paducah, Kentucky e inesperadamente a porta se abriu. Eu ouvi a campainha tocar. A porta se fechou. Havia um velho, velho homem em pé ali. Eu nunca peguei o nome dele, mas quando ele entrou, ele olhou para mim.


Ele disse: "Garoto, você foi chamado para pregar, não é?"
Eu disse: "Sim, senhor."
Ele era um velho, velho evangelista. Ele disse: "Você vê onde está aquele prédio fora deste prédio?
Eu disse, "Sim, senhor".
Ele disse: "Eu costumava pregar ali. O Espírito de Deus desceria e almas seriam salvas.”
Eu disse: "Senhor, por favor, me fale sobre isto."
Ele disse: "Não era nada como este evangelismo de hoje." Ele disse: "Nós pregaríamos por duas ou três semanas e não daríamos qualquer convite para os homens pecadores. Nós prepararíamos e prepararíamos e prepararíamos os corações dos homens até que o Espírito de Deus começasse a trabalhar e quebrantar seus corações.”
Eu disse: "Senhor, como você sabia quando o Espírito de Deus estava vindo para quebrantar seus corações?"
E ele disse: "Bem, deixe-me dar-te um exemplo." Ele disse: "Muitas décadas atrás eu entrei nessa loja para comprar um terno. Alguém tinha me dado $30 e me disse: "Pregador, vá comprar um terno para você amanhã." E quando eu atravessei a porta, um jovem balconista que cuidava da loja voltou-se e olhou para mim e quando ele olhou para mim ele caiu no chão e clamou, ‘Quem pode salvar um ímpio como eu?’. E eu sabia que o Espírito de Deus tinha caído sobre aquele lugar.”

Hoje em dia, nós simplesmente entramos e conversamos com eles e damos-lhes três perguntas exploratórias e perguntamos-lhes se eles querem orar uma oração e pedir para Jesus entrar em seus corações e os fazemos duas vezes mais filho do diabo, que nunca mais voltarão a serem abertos ao Evangelho por causa da mentira religiosa que nós, como evangélicos, temos vomitados de nossas bocas.

Vou dizer algo que Leonard Ravenhill costumava dizer: "Agora você entende porquê eu prego em vários lugares uma vez." Mas essa é a verdade.

Quando lidamos com o pecado superficialmente, em primeiro lugar, estamos lutando contra o Espírito Santo. “Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado" (Jo 16: 8)

Há muitos pregadores populares, hoje, que estão mais preocupados em dar-lhes sua melhor vida agora do que uma na eternidade. E eles falam com orgulho sobre o fato deles não mencionarem o pecado em sua pregação. Eu posso dizer-lhes isto: o Espírito Santo não tem nada a ver com o ministério deles, senão que Ele esteja trabalhando contra. Essa seria a única coisa

Por quê? Quando um homem diz que ele não tem nenhum ministério que trata com o pecado do homem, o Espírito Santo o faz. É um ministério primário do Espírito Santo entrar e condenar o pecado do mundo. E, assim, saibam disso: quando você não trata especificamente, apaixonadamente, amorosamente com o homem e seu estado depravado, o Espírito Santo não está em nenhuma parte perto de você.

Ademais, nós somos enganadores quando lidamos de modo superficial com o mal dos homens, como pastores dos dias de Jeremias. “Eles tratam da ferida do meu povo como se não fosse grave. 'Paz, paz', dizem, quando não há paz alguma.” (Jr 6: 14)

Nós não somos apenas enganadores, mas somos imorais. Como um médico que nega o seu juramento hipocrático, pois ele não quer dizer más notícias a alguém, porque acha que a pessoa se rebelará contra ele, ficará zangado com ele, ficará triste. E, portanto, ele não diz a eles a notícia mais necessária para salvar suas vidas.

Eu ouço os pregadores de hoje. Eles dizem: "Não. Não, não, não, não, não. Você não entende, irmão Paul. Nós não somos como as pessoas do tempo de John e Charles Wesley. Não somos como a cultura que Whitefield se dirigiu ou Edwards. Não somos tão robustos como eles são. Nós estamos quebrados. Nós não temos tanta auto-estima. Nós somos frágeis. Nós não conseguimos suportar pregação como aquelas. "

Ouça-me. Alguma vez você já estudou a vida destes homens? A cultura deles também não podia suportar o que eles pregavam. Ninguém jamais foi capaz de suportar a pregação do evangelho. Ou eles se virarão contra ela com uma fúria de um animal ou eles se converterão.

E para dar-lhes uma coisa sobre nós sermos frágeis e não termos auto-estima: o nosso país e este mundo estão saturados com esta enfermidade nojenta da auto-estima. Nosso maior problema é que nós nos estimamos mais que estimamos a Deus.

Somos também ladrões quando não falamos muito sobre o pecado. Nós somos ladrões.

Deixe-me perguntar-lhe uma coisa. Esta tarde, esta manhã, onde foram todas as estrelas? Será que algum gigante cósmico veio e as recolheu em um cesto e as jogou em outro lugar? Aonde foram todas as estrelas esta manhã? Eles estavam lá, porém você não conseguia vê-las. Mas então, o céu ficou mais e mais escuro e quando virou uma noite negra como breu as estrelas saíram na plenitude de sua glória.

Quando você se recusa a ensinar sobre a depravação radical dos homens, é impossível que você glorifique a Deus, seu Cristo e a sua cruz, porque a cruz de Jesus Cristo e a glória deste é mais magnificada quando é colocada sobre o pano de fundo de nossa depravação.
Ela muito amou, porque foi muito perdoada. E ela sabia o quanto ela tinha sido perdoada, porque ela sabia quão depravada ela era.

Oh, nós estamos com medo de dizer aos homens sobre sua maldade e, por causa disso, eles nunca poderão amar a Deus. Temos roubado a oportunidade de se vangloriarem não em si mesmos, mas para seguir a exortação: "quem se gloriar, glorie-se no Senhor" (2 Co 10: 17).

sábado, 19 de janeiro de 2013

Essa prosperidade é pobre demais!


Autor: Ezequias A. Martins


Recentemente veio o pr. Silas Malafaia novamente pleitear de seus fiéis mais um desafio de sua megalomaníaca visão: ter mil templos espalhados no mundo e mais um canal de televisão para a sua nova denominação: "Assembléia de Deus Vitória em Cristo".

Embora Jesus nunca tenha pedido dinheiro para sua missão, é “favas contadas” que a igreja dele sempre precisou de recursos dos mais diversos para manter seus projetos de serviço, sustento e solidificação da obra de Deus! De maneira alguma venho dizer que a igreja não pode dispor e nem ao menos solicitar o que é legitimado pelas Escrituras para o sustento da obra: os dízimos e as ofertas.

Textos bíblicos podem ser citados com exagero para afirmar o valor bíblico das contribuições de santos. Fico apenas com II Coríntios oito, onde encontramos o apóstolo Paulo enaltecendo a generosidade das igrejas da Macedônia que haviam descoberto a graça de poder participar com as suas posses para a ajuda aos irmãos de Jerusalém que passavam por revezes financeiros. No texto temos até a expressão: “o privilégio de participarem deste serviço a favor dos santos” (v. 4).

É sabido que a igreja desde o primeiro século sobreviveu por doações de fiéis, e até mesmo a igreja do Velho Testamento tinha como princípio o recolhimento dos dízimos e das ofertas para a manutenção do culto e o sustento dos seus ofícios (no caso, os sacerdotes), como vemos em Levitico 27.30: “Também todos os dízimos da terra, quer dos cereais, quer do fruto das árvores, pertencem ao Senhor; santos são ao Senhor”.

Mas o que temos visto já há muito no programa do Silas Malafaia e de outros famosos tele evangelistas é um descalabro, um verdadeiro assalto à mão armada, usando a Bíblia obviamente como arma letal para capturar dividendos dos incautos membros das nossas igrejas, sobretudo dos que já vivem endividados pelos cartões de crédito e empréstimos bancários e que, no afã de se tornarem de um dia para outro prósperos acabam contribuindo para ministérios em troca de orações e bíblias de estudo!

Desde ontem, quando expus em nossa igreja a porção bíblica de I Corintios 3.9-15, estou refletindo sobre alguns pontos que não me sae de minha mente e vem incendiando o meu coração:

Há uma urgente necessidade de fazermos um auto-exame constante para verificação de atitudes, posturas e inclinações acerca da natureza do nosso trabalho na Obra do Senhor. E eu lhe desafio a fazer isso a partir do momento em que você coloca os seus olhos neste artigo.

Isso se torna imperioso quando pensamos sobre os materiais com que o "edificio de Deus", a igreja pode ser ornamentada sobre o fundamento que já está posto, a saber, o próprio Cristo. Esses materiais que podem ser ouro, prata, pedras preciosas, madeira, feno e palha constituem a nossa contribuição para o desenvolvimento da obra de Deus em nossa vida aqui na terra. Schrader coloca essa questão assim: "Alguns homens edificam com o ouro da fé, com a prata da santidade e com as imperecíveis pedras preciosas do amor; mas outros edificam com a madeira morte de esterilidade nas boas obras, com a palha vazia da falta de espiritualidade, com a ostentação do conhecimento, e com a cana quebradiça do espírito continuamente em dúvida".

Quando eu li isso pela primeira vez foi inevitável fazer um contraponto entre o evangelho do Senhor Jesus e esse pseudo-cristianismo denominado "evangelho da prosperidade!". Não se trata obviamente de me colocar como referência de qualquer consideração sobre a bíblica doutrina dos "galardões", mas sim de levar em consideração que, a despeito do nosso fundamento ser Cristo, e isso é verdade também para tantos neo e pseudo-pentecostais que andam diluíndo a Palavra de Deus, chegará um tempo em que todos os disfarces caírão e todos nós vamos estar diante de um fogo que revelará a resistência do material com que adornamos a igreja do Senhor Jesus, e fico então diante de duas (únicas) situações.

Trata-se da primeira, aquela onde aqueles que receberão o galardão de acordo com as suas obras, não em consideração ao "sucesso" de suas empreitadas, pois Deus não analisa a performance, mas à fidelidade, em conformidade com o seguinte texto:

(I Corintios 3:14) - Se a obra que alguém edificou nessa parte permanecer, esse receberá galardão.

E, a segunda consideração, será relacionada à esterilidade de frutos que permanecerão para a vida eterna, com muito show e pouca unção, muito dinheiro envolvido e pouca lisura ética, enfim, muita badalação na carne e pouca piedade no espírito. E o verso para essa situação está em:

(I Corintios 3:15) - Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo.

Meu coração se rasga diante dessa verdade, e fico a pensar de que o resultado não será nada animador para aqueles que, a despeito da salvação já estar adquirida por graça e méritos de Cristo, tiverem de amargar uma eternidade sem o brilho de ricas experiências espirituais onde Cristo constituíria verdadeiramente "tudo em todos"!

Uma lástima! Eu quero o meu galardão no céu e não a prosperidade aqui na terra, pois ela, sem a benção de Deus, é pobre demais!

É o que eu penso!

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

heroína evangélica em novela Global uma estrategia de Satanas



De olho exclusivamente no crescente e promissor mercado evangélico a Globo tem feito de tudo, ou melhor, quase tudo, para agradar o segmento.
Até agora a Globo tem oferecido alguns espaços ao gospel: Festival Promesssas, participação de cantores gospel em programas da emissora, cobertura jornalística das Marchas Para Jesus e de alguns outros eventos evangélicos, reuniões com algumas lideranças evangélicas et cetera.
E como o cerne da questão é meramente mercadológico, a Globo já vem logrando êxito na empreitada. Cantores evangélicos, por exemplo, começaram a gravar, desde 2008, pela Som Livre, gravadora que pertence às Organizações Globo, fundada em 1969. E este a emissora carioca vai emplacar a 1a Feira Internacional Cristã, a ser realizada em São Paulo no mês de julho deste ano.
Quem preveria que aquela que sempre foi estigmatizada como a algoz do evangélicos iria afagá-los um dia? Os tempos mudam. Sim, mudam. Mas a Globo mudou? Acredita-se piamente que por lá nada mudou. Seus programas de afronta aos  princípios cristãos e aos valores familiares  continuam de ‘vento em popa’. A Globo apenas trocou as alfinetadas nos evangélicos pelo bom mocismo oportunista. Somente.
Na ânsia de querer mostrar ao público evangélico que a Globo foi exorcizada, tem gente – do nosso meio – querendo forçar a emissora a exibir uma novela com heroína evangélica.
Não se sabe ao certo qual será a posição da Globo sobre a questão.
Todavia, a Globo, para passar a imagem de que está mudando e amarrar de vez muitos crentes, pode até exibir uma novela para notabilizar os evangélicos. Só isso e nada mais além.
Porém, que benefícios isso trará aos evangélicos, ao Brasil ou à igreja?
Os evangélicos serão ovacionados quando passarem pelas ruas, ou no trabalho ou mesmo perante a vizinhança? Claro que não! E se forem, que glória há?
Tudo permanecerá com antes. Os que dão bons testemunhos continuarão limpando-se cada vez mais e os maus cristãos, sujando-se cada vez mais. A novela não mudará nada em relação aos cristãos, pois é “mister que venham os escândalos”, como disse Jesus.
Se alguém vai obter êxito com a tal novela evangélica, certamente não será a comunidade evangélica nem a Obra de Deus, mas a própria Globo. A audiência vai à stratosfera.
Imaginemos irmãos deixando de ir aos cultos ou abandonando o templo antes do término da reunião de oração para fitarem os olhos na Globo e admirarem a ‘santa’ novela.
Imaginemos irmãos reunindo-se nas casas, não para falarem das coisas relacionadas ao Reino, mas tecerem comentários sobre os próximos capítulos da ‘abençoada’ novela.
Imaginemos os personagens da novela evangélica sendo citados como referência nas pregações ou nas aulas da Escola Bíblica Dominical.
Imaginemos, imaginemos …
As mais desgostosas suposições podemos conjecturar.
Saindo das hipóteses, uma coisa posso afirmar com a mais absoluta certeza: se exibida, a novela evangélica da Globo não trará a Mensagem do Evangelho. Não. Jamais. Em hipótese alguma.
Por que? Porque a mensagem bíblica colide frontalmente com os princípios que norteiam a produção dos programas da Globo, como as novelas, minisséries e outros.
O adultério, a mentira, o homicídio, a devassidão, a fornicação, a prostituição, o homossexualismo, a idolatria, o desrespeito dos filhos aos pais, a falta de amor no lar, a feitiçaria e tantos outros são condenados pela Palavra de Deus e em suas novelas a Globo sempre exibe cenas com uma ou mais práticas citadas.
A Palavra da Verdade expõe o pecado.
A Globo já tem sua preferência religiosa e não vai abrir mão disto.
Portanto, como evangélicos não devemos corroborar com a ideia de se ter uma novela com heroína evangélica.
A igreja não pode estar refém da Globo.
Cristianismo não é entretenimento.
Jesus Cristo não morreu na Cruz para que o Evangelho fosse negociado.
Vigiemos, o adversário não dormita!
FONTE: Holofote.net